Transição Verde e Marco Regulatório
Em entrevista, Eduardo Junqueira Dias fala sobre o potencial do Brasil, comenta possibilidades para transição verde e discute o marco regulatório atualmente em debate no congresso
O mercado de carbono voluntário poderá movimentar US$ 50 bilhões até 2030. As compensações às emissões de poluentes são um dos grandes temas da agenda ambiental. Inclusive debate-se o PL nº. 412/2022 no Congresso, marco regulatório que estabelece o mercado regulado de carbono.
Eduardo Junqueira Dias, co-fundador da OMA Ativos Ambientais, aponta o potencial do Brasil, lembra o interesse de investidores estrangeiros em alocar recursos e ressalta a necessidade da discussão sobre “integridade e reputação” para o futuro desses projetos.
Junqueira Dias participou do 18º Fórum de Economia da FGV, na última semana, em São Paulo. O evento contou com ministros, banqueiros, lideranças empresariais e especialistas, debatendo temas como a retomada do crescimento e a transição ao desenvolvimento verde.
Bússola: em linhas gerais, qual é o status atual do debate sobre os créditos de carbono no país e sua importância?
O futuro do Brasil, pensando em desenvolvimento inclusivo, inovação e geração de riqueza com impacto nos territórios, encontra-se vinculado às agendas verdes e também ao mercado de carbono. A agenda ambiental que foi pauta histórica dos governos brasileiros retoma força e figura como elemento estratégico.
O governo trabalha em um Plano de Transição Ecológica que deve amadurecer neste semestre dando conta de soluções complexas que abarcam dos greens bonds, passando pela taxonomia sustentabilista e pelas diretrizes do mercado de carbono. Sobre esse tema é importante ressaltar a tramitação congressual do PL nº. 412/2022 que regulamenta o Mercado Brasileiro de Regulação das Emissões.
A discussão do carbono passa pela conceituação sobre os mercados regulado e voluntário. O primeiro significa uma regulação do governo criando limites de emissões, enquanto no segundo a compensação via créditos acontece através das organizações que estabelecem voluntariamente metas de redução de emissões.
Para o caso brasileiro, além das boas experiências internacionais, devemos pensar na complementaridade entre regulado e voluntário, maximizando a atração de investimentos e acelerando as “nationally determined contributions”.
Mercado e governo devem diagnosticar e resolver gargalos – da preservação dos biomas ao empoderamento das comunidades, passando pela reindustrialização, matriz energética limpa e bioeconomia. Esforços que criam um mercado sofisticado e oportunidades para os investidores e cidadãos impactados pelos projetos.
Bússola: quais você avalia que são os principais aspectos que potenciais investidores estrangeiros devem observar na avaliação de investimentos verdes no Brasil?
Sustentamos um potencial enorme para trazer investimentos ao Brasil. Seremos a “bola da vez” do desenvolvimento verde, uma referência para os outros países. É como se a decolagem do Cristo Redentor na The Economist em 2009 voltasse agora pintado de verde e coberto de floresta.
Ser “bola da vez” é algo que se explica naturalmente, afinal fomos líderes nas conferências climáticas e concentramos os biomas mais ricos do planeta, além do nosso amplo parque energético de matriz limpa e do potencial de expansão para solar, eólico (onshore e offshore) e, claro, hidrogênio verde.
Além da disposição desses agentes em investir no Brasil, nós precisamos fazer a lição de casa. A lógica do mercado de carbono exige depurarmos projetos offsets com integridade e reputação. O financiamento da transição ao desenvolvimento verde demanda boa-regulação, regras claras e instrumentos para monitoramento dos projetos nacionais.
O Brasil deve mostrar que tem confiabilidade e está comprometido com o desenvolvimento sustentável. Assim, torna-se fundamental utilizarmos regras para conciliar mercado regulado doméstico e voluntário, estabelecendo um marco e segurança jurídica para atração de investimentos e sucesso dos projetos.
Nessa linha, o Ministério da Fazenda lidera a criação da taxonomia aplicável ao ecossistema da sustentabilidade que deve ficar pronto até a COP-30 sediada em Belém.
Bússola: pode citar alguns aspectos que envolvam a questão de integridade e reputação para projetos de compensação de emissões?
Esse aspecto é fundamental. O Brasil precisou ancorar expectativas de modo que agendas mais propositivas desabrocham nesse segundo semestre. Para o mercado de carbono e a lógica do desenvolvimento sustentável são importantes o PL nº. 412/2022 e o PTE, criando regras e padrões para metas de emissões e mercado de carbono em geral.
Estive presente na Climate Week, onde observei dois aspectos: a disposição de investidores internacionais e governos para investirem no Brasil, bem como da desconfiança em relação ao vetor de integridade dos nossos ativos. O caso do Pará que repercutiu recentemente na imprensa reforça a percepção dos gargalos a serem solucionados.
O Brasil deverá se aproveitar da maturidade dos mercados de carbono estabelecidos e regulados, entre eles, o californiano, o australiano e o europeu, traduzindo esse inputs aos laços que nos conectam aos países vizinhos e ao contexto da experiência brasileira. Devemos evitar regulamentações confusas e arbitrárias, inibidoras de novos projetos e investimentos.
Podemos afirmar que o Brasil, pode se tornar o maior destino global de investimentos para projetos de compensação das emissões. O mundo inteiro está valorizando essa agenda, algo que nunca se viu na história. E o Brasil tem uma oportunidade enorme, em que para fazer jus a ela, é preciso que tenhamos condições de oferecer projetos com integridade e reputação.
Bússola: em termos de ‘agenda nacional’ para este tema, o que destaca no momento do país?
Todas essas pautas de uma agenda nacional perpassam a resolução de problemas tangíveis, da regularização fundiária das propriedades ou do vergonhoso desmatamento dos biomas e florestas, que no Brasil corresponderam ao grau de 50% das emissões (e no mundo representam 10%).
É importante pensar no encadeamento entre pesquisa, biodiversidade e impacto social, envolvendo tanto empresas e bancos públicos – Embrapa e BNDES (provedor de garantias e “comprador atacadista”) – quanto agtechs e grupos empresariais.
O compromisso com ESG deve ser assumido pelo setor produtivo com disrupção tecnológica, reindustrialização e baixa emissão. É necessário pensar em caminhos para que haja um aumento de inovação, produtividade e interação com cadeias produtivas globais, nos colocando como protagonistas na economia de baixo carbono.
Da perspectiva estratégica, o Brasil também é a “bola da vez”. Em 2024, o Brasil presidirá o G20 e a cidade do Rio de Janeiro sediará a reunião anual do bloco. Já em 2025, Belém receberá a COP-30 no coração da Floresta Amazônica.
É importante ressaltarmos a responsabilidade socioambiental inerente aos projetos, envolvendo as comunidades tradicionais e os territórios nos benefícios maximizados do carbono. É a agenda do futuro conectada à preservação dos biomas, projetos de energia limpa, à recuperação de pastagens degradadas, à reindustrialização e uma série de outras possibilidades de futuros inclusivos e prósperos.
Fonte: EXAME
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